30.3.09

Um presente-surpresa, fantastico!

Que a vida humana é apenas um sonho outros já disseram, mas também a mim esta idéia persegue por toda a parte. Quando penso nos limites que circunscrevem as ativas e investigativas faculdades humanas; quando vejo que esgotamos todas as nossas forças em satisfazer nossas necessidades, que apenas tendem a prolongar uma existência miserável; quando constato que a tranqüilidade a respeito de certas questões não passa de uma resignação sonhadora, como se a gente tivesse pintado as paredes entre as quais jazemos presos com feições coloridas e perspectivas risonhas - tudo isso me deixa mudo. Meto-me dentro de mim mesmo e aí acho um mundo! Mas antes em pressentimentos e obscuros desejos do que em realidade e ações vivas. E então tudo paira a minha volta, sorrio e sigo a sonhar, penetrante adiante no universo.
Que as crianças não sabem o porquê de desejarem algo, todos os pedagogos estão de acordo. Mas que também homens feitos se arrastem como crianças, titubeando sobre a face da terra, e, exatamente como elas, não saibam de onde vêm e para onde vão, até mesmo que não têm um fim determinado para suas ações, igualmente governados por biscoitos, balas e chibatas, ninguém faz gosto em acreditar. Quanto a mim, parece-me que não há realidade mais palpável do que essa.
Concordo de boa vontade, até porque sei o que vais me dizer a respeito disso, que são exatamente essas as pessoas mais felizes. Essas mesmas que, como crianças, vivem o dia-a-dia sem pensar no futuro, arrastam suas bonecas por aí, vestem-nas, despem-nas, e voltam cheias de respeito diante da gaveta onde a mamã chaveia os bombons, e quando logram êxito, enfim, fazendo com que ela os dê, devoram-nos estufando a boca e gritando: Mais!...Sim, estas é que são criaturas felizes! A coisa também vai bem para aqueles que dão um título imponente para seus trabalhos vagabundos, ou até para seus sofrimentos, e os descrevem como obras gigantescas em prol da salvação e da prosperidade do gênero humano... Feliz daquele que consegue proceder assim! Mas aquele que reconhece em sua humildade onde tudo isso vai parar, quem vê quão gentil é o burguês ao ornamentar seu jardinzinho e elevá-lo a categoria de paraíso; quem tem noção de como o infeliz se arrasta infatigável pelo caminho, sob seu fardo, interessado apenas em contemplar por um minuto a mais a luz do sol – este, asseguro, também é tranqüilo e, ao construir um mundo dentro de si, é feliz do mesmo jeito por ser humano. E então, por mais limitado que esteja em seus movimentos, ele mantém no coração a doce sensação de liberdade, sabendo que poderá deixar o seu cárcere quando quiser.

GOETHE

Um comentário:

Anônimo disse...

Cada vez melhores os textos que tu selecionas, assim como os quais tu escreves.

beijo

Jorgito